quinta-feira, fevereiro 05, 2009

Noite de Cabíria



Dia 4 de fevereiro de 2009. Resultado da primeira chamada da Fuvest. Um dia já tenso, que não melhorou quando a UOL divulgou por engano a lista de aprovados do ano passado, criando crises desnecessárias e frustrações duplicadas. Não interessam mais as manobras políticas de Sarney e Temer que definirão o próximo presidente. No dia em que seu nome não está na Fuvest 2009, você não pensa no que vai acontecer em 2010, porque só pensa no ano anterior jogado no lixo.

Quando não encontrei o nome da minha amiga na lista hesitei um pouco, mas acabei mandando uma mensagem pelo MSN: “eu fico quieto, você fala se quiser, nós bebemos.” Combinado. Ela não queria escolher, fomos ao Santa Augusta. Heinekens 600 ml e uma chapa de calabresa com ervas.

Entre incertas batidas eletrônicas e a escolha definitiva por um DVD de clipes da Björk, tivemos um momento em que o telão estava ocupado por cenas do Clube da Luta. Ela não havia visto o filme, recomendei e falei um pouco de sua violência. Ela não gostava muito de violência, não conseguira terminar Laranja Mecânica, Irreversível lhe causava repugnância - raiva, um desejo de vingança. Falamos do sofrimento conformista de Charlie Brown, passamos pela impotência de Macabea, mencionamos traumas cinematográficos e assim fomos falando de sentimentos sem precisar dizer o que realmente estava os provocando.

Logo acima do pôster do Akira Kurosawa, estava o de Os Palhaços, de Fellini. “Sabe o que é realmente triste?” - perguntei. Andando em uma estrada, após ter se dado mal, repetindo o que havia acontecido no filme todo, sem perspectiva e destruída, Cabíria se depara com uma festa popular. Todos felizes, ela acabada, todos vivendo, ela só avançando. E então, ocorre a cena mais sádica, cruel e desesperadora do cinema. Ocorre o sorriso mais triste da história, um sorriso desgraçado e arrasador, um sorriso feliz. Depois de toda a merda, Fellini mostra cruelmente para nós que Cabíria consegue sorrir de novo, consegue ganhar energia para continuar com sua vida de merda. Ele esfrega na nossa cara que, não importa como foi 2008 se há um 2010. O tipo de mensagem que, neste dia, só faz despertar os mais profundos instintos assassinos a respeito desse italiano maldito e seu atroz Noites de Cabíria.

A noite passou, os olhinhos da minha amiga foram ficando vermelhos, sua boca controlando bocejos. Sem sorrisos sádicos, ao menos, conseguiu dormir.