segunda-feira, abril 27, 2009

Os Augustos


 O fato é que você precisa saber da piscina
subir e descer a Augusta
rodopiando entre as putas
sem noção de gravidade
se entregar para a cidade
vomitar pelo asfalto a tua liberdade
[Galharufa (O Dia em que Francisco Cuoco Transcendeu a Lei da Gravidade)]

Letras pitorescas e urbanas são a prioridade de Eristhal (voz, violão, cavaco), Felipe Abdalla (percussão) e Chico (percussão) em seu projeto Os Augustos. O trio cuja história se mescla à ascensão do Bar do Netão, um dos mais vibrantes e descontraídos do Baixo-Augusta, marca presença no espaço tocando samba rock, soul, funk e Jovem Guarda. Há sete anos, Eristhal, 25, já frequentava a Augusta às 2h da madruga após tocar na Barra Funda. O que atraía o paulista de Pirajus era em parte o medo, preferindo beber sozinho em um local com bastante movimentação.

Mas outra parte importante da atração era o que chamou de “cheiro de sexo”. Chico, 24, frequenta a região desde 2006, quando chegou de Piracicaba, e veio conhecer a Augusta por ter um olfato muito semelhante ao de Eristhal. “Adoro as propostas de cinco reais, três cervejas, caipirinha e…”, disse Chico na quarta-feira (22), quando conversamos no Bar do Netão. A ideia começou quando Eristhal, “de saco cheio de tocar sozinho”, chamou seu antigo parceiro de Barra Funda, Felipe, 25, para um novo projeto.

Assíduos do bar, já conheciam o DJ residente das quintas, o Chico – também um “músico orgânico” – para formarem o… Pra Quarteto Falta Um. O nome não durou. “Pô, a gente se encontra na Augusta, bebe na Augusta, frequenta a Augusta”, explicou Eristhal como o nome ficou óbvio.


Ando bebendo com o diabo
ando fumando mil baseados
ando cheirando… ando cheirando…
ando cheirando… ando cheirando…
 cachorro molhado!
Mais um vagabundo perdido no mundo
rodando na rua… Augusta from Hell!
[Augusta From Hell]


A regra do grupo é experimentar e difundir sua música em um show-ensaio, que acontecia às quartas no Bar do Netão, até o PSIU dar as caras.

“Tá faltando o PSIU deixar a gente em paz”, reclama Eristhal numa Augusta que mudou bastante da época em que o Bar do Netão era uma jukebox e uma mesa de sinuca. Mais baladas, mais opções, mais segurança resultaram em uma imagem menos marginalizada da região e a atração de uma “galera mais freak, mais hype”.

Mas a principal mudança que Os Augustos notaram está mesmo relacionada ao olfato: as mulheres. Tudo parece estar cheirando bem.

Contato para shows: Eristhal (8448-8332) – osaugustos@hotmail.com

Colaboraram Giulia (bê) e Carol.

segunda-feira, abril 13, 2009

Vegans e vegetarianos



Era uma vez Rodolfo. Certo dia, ele foi comprar uma galinha em uma granja e levou um choque com as condições do lugar e com o abate. Decidiu que iria parar de comer carne. Então, consultou nutricionistas, fez pesquisas em sites e não resistiu à especialidade de porco de sua mãe. Foi quando percebeu que não era uma decisão de contos de fadas: teria que abrir mão de muita coisa.

Na época, ele não conhecia os vegans, com quem mais tarde se identificou. Agora, vegetariano e trabalhando numa manhã recente na Padaria 100% Vegan, ele me explicou algumas das filosofias que compartilha com o movimento. Para ele, a questão está no processo de criação e abate dos animais, algo desumano. No caso de pessoas em lugares isolados, criando seus próprios animais para consumo próprio, não existe problema, na opinião de Rodolfo.

Mas se foi o processo de urbanização que tornou o animal em um fetiche – alienado de seu valor senão o de consumo -, é exatamente esse processo que fornece alternativas. Na nossa região ou adjacências, é possível ser vegetariano ou lacto-vegetariano sem precisar de sacrifícios imensos. É possível tomar o café-da-manhã na recém-inaugurada Padaria 100% Vegan, almoçar em alguns dos Gopala (ou atravessar a Paulista para o Vegacy), tomar um lanche no Sabor Mate, um sorvete de leite de soja na Soroko e terminar a noite na Z Carniceria ou no Espaço Impróprio.

Em essência, o movimento repudia qualquer coisa que atrapalhe o ciclo natural dos animais – como ir ao cinema, pois a película cinematográfica tem componentes animais. É uma filosofia que se realiza principalmente na esfera do mercado, evitando consumir qualquer coisa relacionada a animais, e que divulga informações por meio de livros, revistas, marcas, redes de contato e conferências. Eles também atuam em organizações em defesa dos animais e coletivos.

Tudo isso para comentar a foto acima. Acho que esses stêncils sintetizam um pouco da Augusta – um monte de gente aparentemente diferente, que na verdade fala da mesma coisa. Para mim, o cara pró-libertação animal entende essa militância como uma forma de alcançar uma emancipação muito parecida com a da pessoa que fez o stêncil de resposta. Mas parece que todos estão tão envolvidos em suas próprias prioridades que ignoram o diálogo produtivo que podem travar um com o outro.

Serviço:
Padaria 100% Vegan – Rua Fernando de Albuquerque, 57 (diariamente, das 7h às 22h – exceto feriados) — vegetariano
Gopala Madhava – Rua Antônio Carlos, 413 (almoço: seg. a sex., das 11h30 às 15h; sáb., das 12h às 15h – exceto feriados) — indiano lacto-vegetariano
Gopala Hari - Rua Antônio Carlos, 429 (almoço: seg. a sex., das 11h30 às 15h; sáb., das 12h às 15h / jantar: sex. e sáb., das 19h30 às 22h30) — indiano lacto-vegetariano
Lanchonete e Restaurante Vegacy - Rua Augusta, 2061 (seg. a sáb., das 10h às 22h; dom., das 10h às 16h) — vegetariano
Lanchonete Sabor Mate – Rua Augusta, 1942 (das 8h às 22h) — vegetariano e lacto
Sorveteria Soroko – Rua Augusta, 305 (das 12h às 22h) — tem sorvete de leite de soja
Z Carniceria - Rua Augusta, 934 (ter., qua. e dom., das 19h30 à 1h30; qui. a sáb., das 19h às 3h30) — balada vegetariana
Espaço Impróprio – Rua Dona Antônia de Queiroz, 40 — multi-espaço vegan

segunda-feira, abril 06, 2009

Encontros e Desencontros

Quando Bob Harris (Bill Murray) e Charlotte (Scarlett Johansson), no filme de 2003 Encontros e Desencontros (Lost in Translation, Sofia Coppola), se encontraram em um hotel em Tóquio, cada um carregava um casamento opaco e frustrações com os rumos da vida. A identidade foi instantânea, a crise de meia-idade e as incertezas de uma recém-formada se envolveram no questionamento: o que fiz, o que estou fazendo e o que farei com a minha vida?

No último final de semana, dois aniversários reuniram pessoas que há muito não se viam no Eclético's. Amigos na faixa dos 23 a 27 anos que compartilharam faculdade, projetos e sonhos e agora se distribuem – não necessariamente dispersos – pelo Brasil e o mundo. As perguntas de Bob e Charlotte eram inevitáveis.
Pode ser que tenha sido uma noite de desencontros. Estávamos lá porque tivemos um dia um cotidiano em comum que não vai voltar. Ao mesmo tempo, um certo cotidiano opaco esvaziava conversas para níveis básicos de reconhecimento – “Por onde anda, como está” – e a repetição das respostas mostrava como a vida foi ficando circunscrita a algumas poucas palavras que hesitamos em repetir. Chegamos a agradecer a mídia de massa por dar assuntos em comum.

Pode ter sido, no entanto, também uma noite de grandes encontros. Estávamos lá recuperando um vínculo que não se dissolveu. Ao mesmo tempo, as boas notícias nos davam energia e possibilidades, enriquecendo conversas com planos em comum, identidades inesperadas, superações encantadoras. Quando repetíamos nossas respostas, aos poucos a noção de uma identidade, uma segurança do que já foi construído foi se assentando, nos preparando para os próximos passos. E foi sensacional descobrir que compartilhamos as mesmas impressões por alguns fatos que passam na mídia, gestos e saudações – “Ma man!” – que acabam nos aproximando.

No desemprego ou tendo que escolher entre Paris e Genebra, as crises variavam de origem. Mas as incertezas e o desejo por um rumo eram constantes – e era isso que dava conforto, não estávamos sozinhos, todos em contínua formação. Está muito difícil, não sabemos se vai dar certo, mas continuamos no percurso, todos juntos em suas vidas separadas.

As risadas, sorrisos e abraços em meio à luz melancólica do boteco da metrópole da solidão funcionaram como aquele sussurro de Bob a Charlotte. Cada um está seguindo seu caminho, mas foi tudo que precisávamos para continuar.